terça-feira, 24 de junho de 2014

AULA 18: Produção de doces e geléias


4. Produção de doces e geléias

(Capítulo 4 do Módulo 3 da apostila do Curso de Agricultura Natural)

A produção de doces e geléias (jams) é uma alternativa não apenas para agregar valor à produção da machamba mas também uma forma de conseguir preservar parte de nossas colheitas. Se bem conduzida, a produção de doces, geléias, licores, etc. implica em redução de parte do teor de água de muitos dos nossos alimentos e também da introdução de açúcar que, ao aumentar a pressão osmótica do nosso alimento processado, reduz a ação de microrganismos degradadores. Já para o caso dos produtos fermentados como os licores, o teor de álcool no final do processo é que irá desempenhar esse papel de preservação. Mas cuidado! Não existe magia nesse tipo de processamento e todos os cuidados com higienização, preparo do ambiente de trabalho, cuidado com a escolha dos alimentos nos pontos de maturação corretos e a própria técnica de fabrico são fundamentais para garantir a qualidade dos produtos finais e consequentemente alcançar os rendimentos desejados bem como os tempos de preservação possíveis para cada caso.

Existem vários tipos de doces. Como exemplo podemos citar as frutas cristalizadas, os doces em caldas, também chamados de compotas, os doces pastosos e as geléias. As variações nas receitas são quase infinitas, se lembrarmos que muitos doces podem ser combinações de dois ou mais ingredientes como no caso do doce de abóbora com coco ou ainda as compotas mistas de de papaia e manga, e muitos outros.



Preparo dos frascos de vidro para armazenamento dos doces e geléias

Tão importante quanto preparar corretamente nossos doces e geléias é o cuidado que devemos ter com a higienização dos materiais com os quais iremos cozinhar. E além disso, será fundamental conseguirmos esterilizar corretamente os frascos de vidro nos quais iremos armazenar nossos produtos.

O ideal é que sejam usados frascos novos, com tampas metálicas. Entretanto, é sabido que em muitas regiões esses materiais não estão prontamente disponíveis, principalmente no interior das províncias de muitos países africanos. Sendo assim, ao escolher algum frasco de vidro que tenha sido usado anteriormente, assegure-se de que não tenha armazenado nenhum tipo de produto perigoso à saúde como venenos, detergentes, combustíveis, etc.

O processo de esterilização dos frascos é relativamente simples de se fazer. Basta ter um grande caldeirão com água fervente e deixar os materiais nesse processo por pelo menos 5 (cinco) minutos. Isso inclui tanto os frascos como as tampas metálicas. Dessa forma, todo e qualquer resíduo de material orgânico onde eventualmente possa ter crescido e desenvolvido algum tipo de microrganismo prejudicial à saúde, irá ser retirado e os microrganismos mortos.

Os frascos esterilizados dessa maneira não podem mais ser lavados em água corrente e devem ser guardados tampados com todo o cuidado até o momento do uso. Recomenda-se que eles sejam armazenados numa caixa plástica com tampa para não mais serem contaminados com materiais estranhos. A sua manipulação tembám precisará ser feita com o auxílio de luvas limpas ou mesmo algum tipo de pegador ou pinça. Se estes cuidados não forem tomados, todo o processo de esterilização deverá ser repetido antes dos frascos serem utilizados.



Doce de abóbora

O cultivo das abóboras pode ser tornar um negócio bem rentável para o agricultor camponês. Além de ser um alimento muito nutritivo e saboroso, sua versatilidade culinária pode agregar considerável valor à cadeia de produção agroecológica da propriedade camponesa. Assim, as abóboras podem ser usadas em cremes e sopas, além de vários tipos de doces e geléias. Vale ressaltar que todas as partes do fruto são comestíveis e nutritivos e, na medida do possível, será muito interessante aproveitá-lo integralmente. As sementes podem, por exemplo, ser torradas e depois consumidas inteiras ou ainda trituradas e misturadas em produtos de panificação; as cascas podem ser fritas como batatas ou ainda cozidas e usadas como ingredientes de sopas; o miolo, aquela “rede” que prende as sementes no interior do fruto, pode ser usada até como uma espécie de espagueti. Contudo, para a produção de doces, o mais comum é usarmos a polpa que deverá estar bem madura. A seguir vamos dar, a título de exemplo, uma receita típica de doce de abóbora com coco. Mas atenção! Esta receita não é única e nem imutável. Tenha em mente que sua criatividade e talento na cozinha poderão fazer a diferença na hora de se produzirem verdadeiras iguarias que certamente irão atrair muitos clientes e compradores ocasionais de seus produtos.



RECEITA

  • 1 kg de abóbora sem casca e cortada em pedaços médios
  • 2 chávenas de chá de açucar castanho
  • 1 canela (cinamomo) em pau
  • 3 cravos da índia
  • Coco ralado fresco a gosto
  • Em uma panela grande colocar a abóbora, o açúcar, a canela e os cravos. Levar para cozinhar em lume brando com a panela tampada. Mexer sempre e amassar com uma colher de pau para desmanchar a abóbora. Quando ela estiver bem cozida, retirar a canela e os cravos e juntar o coco. Deixar apurar mais um pouco e desligar o lume. O doce não pode ficar seco, tem que ficar bem úmido.



O armazenamento do doce de abóbora deverá ser feito em frascos de vidro previamente esterilizados. Coloque o doce no vidro aos poucos, certificando-se de que não fiquem bolhas de ar no interior da massa. Isso pode ser conseguido usando-se um garfo metálico limpo para mexer levemente o doce no interior do vidro e ainda com algumas batidas leves no fundo do frasco. Em seguida, colocar a tampa no vidro de modo a não fechá-la totalmente. Levar o conjunto de vidro para um caldeirão de alumínio e cuidadosamente adicionar água até que esta fique na metade da altura dos vidros. Acender o lume e deixar ferver por 20 (vinte) minutos. Com muito cuidado, retirar os vidros segurando pelas tampas semi-rosqueadas e imediatemente fechá-las bem. Pronto! Seu doce poderá ser conservado por meses antes do frasco ser aberto. Porém, assim que abrir o frasco, o consumo do doce (ou geléia) deverá ocorrer em poucos dias, se forem mantidos em geleiras.



Geléia de massala (jam de massala)

A massala (monkey fruit) pode ser uma excepcional fonte de renda para os agricultores. Normalmente na região de Maputo, os agricultores se limitam a vender apenas os frutos maduros, recolhidos das matas e machambas onde essa fruta nasce de forma espontânea. Contudo, pelas suas propriedades nutricionais e sabor característico, a massala tem um grande potencial econômico e estratégico para o desenvolvimento econômico de famílias de agricultores camponeses.

O processamento da massala passa pelo seu despolpamento. Uma forma bem caseira de se conseguir isso é usando um processador caseiro como mostrado na foto abaixo. O uso de alguns acessórios fáceis de serem encontrados nesse tipo de equipamento ajuda muito na hora de separar a polpa da massala das sementes. O despolpamento manual também pode ser feito, mas nesse caso o tempo e o rendimento do trabalho serão bem menores. Outra alternativa é usar uma peneira de aço, com abertura de aproximadamente 5 mm, e raspar a polpa recém retirada do fruto em sua superfície. Porem, tenha em mente que operações manuais como estas devem ser precedidas dos devidos cuidados com a higiene pessoal, como já foi discutido anteriormente.








(Processador caseiro usado para despolpar a massala.)


Uma vez obtida a polpa da massala podemos processá-la imediatamente ou ainda congelá-la, preservando-a assim por vários meses. Isso pode ser muito interessante, pois o produtor que dispuser de um pequeno freezer (arca) poderá conservar polpas de frutas para serem oferecidas no mercado em épocas onde normalmente já não estão disponíveis nos mercados. Além disso, o agricultor também pode gerenciar melhor sua própria produção, escalonando o processamento à medida que for tendo demanda pelos seus produtos ou ainda de acordo com as próprias instalações de processamento que ele possuir.

A geléia de massala é um dos produtos mais simples que podem ser obtidos com a polpa, congelada ou não. Na sua receita entram apenas dois ingredientes, a polpa de massala e o açúcar castanho (preferencialmente). Pode ser usada uma proporção de 2:1 entre a polpa e o açúcar. Por exemplo, para cada 0,5 kg de polpa de massala, usamos 250 g de acúcar castanho. Essa proporção poderá ser modificada, mas atenção para o uso do açúcar. É bom evitar os excessos e dessa forma aumentar a proporção de acúcar na mistura não só deixará o produto demasiadamente doce como também poderá causar eventuais problemas para quem os consumir em maiores quantidades. O ideal, portanto, é usar uma quantidade mínima de açúcar para garantir a preservação do doce sem transformá-lo numa “bomba calórica”, e ainda fazendo com que os sabores das frutas se sobressaiam ao sabor do próprio açúcar.



RECEITA

  • 500 g de polpa de massala
  • 250 g de açúcar
  • Misturar os ingredientes numa panela e levar ao lume brando. Deixar levantar fervura e mexer com um colher de pau suavemente e de forma constante, evitando que se forme um crosta no fundo da penela, por 20 minutos. Retirar do lume e transferir para um recipiente limpo, preferencialmente de vidro, e deixar esfriar. Servir com bolachas, pão ou ainda como cobertura ou recheio de bolos.


O armazenamento da geléia de massala deverá ser feito exatamente como no caso do doce de abóbora.



Geléia de morango

Como veremos mais adiante no nosso Curso de Agricultura Natural, o cultivo de morangos pela Agricultura Natural vem sendo um sucesso na região de Maputo. Porém, um dos pontos críticos no sistema global de produção é a preservação dos frutos maduros que, via de regra, necessitam de um ambiente refrigerado e, como não usamos nenhum tipo de conservante, um curto espaço de tempo entre a colheita e a sua comercialização. Portanto, a produção de geléias é uma das alternativas de mais baixo custo ao produtor camponês para conservar sua produção de morangos diante das condições que muitas vezes se verificam de falta de logística de armazenamento e transporte dos produtos frescos.

Diferentemente do caso das massalas, os morangos não precisam ser despolpados, o que falicita em muito a produção de geléias e doces. Contudo, é necessário lavar bem os frutos e retirar as folhas da base do fruto antes de processá-lo. Isto significa, mais uma vez, cuidados adicionais com a higiene pessoal, do local de trabalho e dos utensílios que serão utilizados durante o trabalho.

Basicamente podemos desenvolver dois tipos de geléias de morango. O primeiro tipo é obtido com os frutos inteiros e a geléia assim obtida é própria para acompanhar sorvetes, coberturas e recheios de bolos, etc. O segundo tipo é feito com os frutos triturados e produzirá uma geléia mais uniforme, sem pedaços de frutas que será ideal para passar no pão ou em bolachas. Esse tipo de geleia mais pastosa é o padrão usado por muitos restaurantes e hotéis, que poderão ser um interessante mercado consumidor para esse produto.



RECEITA

  • 600 g de morangos maduros (inteiros ou triturados)
  • 380 g de açucar castanho
  • 1 colher de sumo de limão fresco
  • Colocar todos os ingredientes numa panela e, sob lume brando, deixar cozinhar por cerca de 35 minutos, mexendo de vez em quando para não deixar grudar no fundo. Não é necessário adicionar água pois o sumo dos frutos irá ser liberado rapidamente, facilitando o cozimento da mistura. Transferir para frascos de vidro previamente limpos e esterilizados ainda quente. Tampar e deixar esfriar antes de consumir.

O armazenamento da geléia de morango deverá ser feito exatamente como no caso do doce de abóbora.



Licor de Laranja (Cointreau)

Os licores também são uma excelente alternativa para agregar valor na produção agrícola camponesa. Praticamente podemos obter bons licores de quase todas as frutas de nossa machamba. Contudo, para cada tipo de fruta, ou parte dela, existe uma forma específica de praparar as infusões que produzirão os licores. Licores de frutas como a laranja, a tangerina e o ananás, por exemplo, são produzidos a partir das cascas. Já no caso de jambalões e outros frutos similares, os licores são obtidos pela infusão dos frutos inteiros.

No caso do licor de laranja e de tangerina, precisamos preparar as cascas antes de promover a infusão. Dessa forma, selecionamos os melhores frutos com as cascas mais uniformes e bonitas. Estas cascas, depois de retiradas, são deixadas a secar à sombra por pelo menos uma semana. Dessa forma, extraímos a maior parte de substâncias voláteis que poderiam conferir um sabor demasiado forte ao nosso licor. Depois de secas, as cascas são transferidas para um vidro de boca larga (e tampa) e em seguida adicionamos açúcar fino e álcool de cereais ou vodka.

O açúcar fino é preferível ao açúcar cristal pois facilitará o processo de dissolução natural e o consequente aumento do grau alcoólico do licor. Na medida do possível, devemos evitar o consumo do açúcar refinado industrialmente, pois no seu processamento global são acrescidos diversos químicos que, com um consumo constante, podem levar a alguns problemas sérios de saúde. A forma mais simples de obter açúcar fino em casa é batendo uma quantidade de açúcar cristal marrom no liqüidificador. Contudo, se não tiver um liqüidificador, pode usar o açúcar cristal marrom diretamente no preparo do licor.



RECEITA

  • Cascas de 6 frutos de laranja (ou tangerina) limpas e secas
  • 1 kg de açúcar fino (ou açúcar cristal marrom, preferencialmente).
  • 1 litro de álcool de cereais (próprio para produção de licor), vodka ou aguardente.
  • Coloque todos os ingredientes num vidro com tampa larga. Deixe descansar à sombra e em local limpo por pelo menos 1 (uma) semana (quando provavelmente todo o açúcar irá se dissolver). Com a ajuda de uma colher de aço inoxidável e uma peneira, separar as cascas de laranja e deitá-las fora. Retornar o líquido para o vidro e tampá-lo bem. O ideal é deixar o licor descansar por pelo menos 1 (um) mês antes de ser consumido.



OBSERVAÇÕES IMPORTANTES!

1) Como estamos trabalhando com a Agricultura Natural, não temos preocupações com a presença de químicos tóxicos oriundos de pulverizações em nossos pomares de frutas. Por isso, utilizamos as cascas de laranja (e tangerina) sem esse tipo de preocupação.

2) O álcool etílico (etanol) vendido em farmácias e supermercados não pode ser usado para fins alimentícios, pois ele contém traços de metanol, um poderoso químico que causa complicações à saúde, em especial aos olhos.

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